segunda-feira, 9 de abril de 2012

Aeroporto

Chovia, chovia, chovia e eu ia indo por dentro da chuva ao encontro dele, sem guarda-chuva nem nada, eu sempre perdia todos pelos bares, só levava uma garrafa de whisky barato apertada contra o peito, parece falso dito desse jeito, mas bem assim eu ia pelo meio da chuva.
Uma garrafa de whisky na mão, um maço de cigarros molhados no bolso. Teve uma hora que eu podia ter tomado um táxi, mas não era muito longe, e se eu tomasse um táxi não poderia comprar cigarros, nem whisky, e eu pensei com força então que seria melhor chegar molhada da chuva, porque aí sairíamos dali e beberíamos o whisky.
Fazia frio, nem tanto frio, mais havia umidade entrando pelo pano das roupas, pela sola fina esburacada dos sapatos, e beberíamos sem medidas, haveria música, sempre aquelas vozes roucas, aquele sax gemido e o olho dele posto em cima de mim, ducha morna distendendo meus músculos.
Mas chovia ainda, meus olhos ardiam de frio, o nariz começava a escorrer, eu limpava com as costas das mãos, eu enfiava as mãos avermelhadas no fundo dos bolsos e ia indo, eu ia indo e pulando as poças d'água com as pernas geladas. Tão geladas as pernas e os braços e a cara que pensei em abrir a garrafa para beber um gole, mas não queria chegar lá meio bêbada, hálito fedendo, não queria que ele pensasse que eu andava bebendo, e eu andava, todo dia um bom pretexto, e eu não queria que ele pensasse que eu andava insone, e eu andava, roxas olheiras, teria que ter cuidado com o lábio inferior ao sorrir, se sorrisse, e quase certamente sim, quando o encontrasse. E a escova do cabelo tão bem preparada, havia se desmanchado e eu não queria que ele visse e pensasse que eu andava relaxando, sem me cuidar, e eu andava, e tudo que eu andava fazendo e sendo, eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso, me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era.
Começou a acontecer uma coisa confusa na minha cabeça, essa história de não querer que ele soubesse que eu era eu, encharcada naquela chuva toda que caía, caía, caía e tive vontade de voltar para algum lugar seco e quente, se houvesse, e não lembrava de nenhum, ou parar para sempre ali mesmo naquela esquina cinzenta que eu tentava atravessar sem conseguir, os carros me jogando água e lama ao passar, mas eu não podia, ou podia mas não devia, ou podia mas não queria ou não sabia mais como se parava ou voltava atrás, eu tinha que continuar indo ao encontro dele, ou podia mas não queria ou não sabia mais como se parava ou voltava atrás, eu tinha que continuar indo ao encontro dele, que fugiria comigo para a sua casa, e que me abriria a porta, o sax gemido ao fundo e quem sabe uma lareira, pinhões, vinho quente com cravo e canela, essas coisas do inverno, e mais ainda, eu precisava deter a vontade de voltar atrás ou ficar parada, pois tem um ponto, eu descobria, em que você perde o comando das próprias pernas, não é bem assim, descoberta tortuosa que o frio e a chuva não me deixavam mastigar direito, eu apenas começava a saber que tem um ponto, e eu dividida querendo ver o depois do ponto e também aquele agradável dele me esperando quente e pronto.

Um carro passou mais perto e me molhou inteira, sairia um rio das minhas roupas se conseguisse torcê-las, então decidi na minha cabeça que depois de abrir a porta ele diria qualquer coisa tipo mas como você está molhada, sem nenhum espanto, porque ele me esperava, ele me chamava, eu só ia indo porque ele me chamava, eu me atrevia, eu ia além daquele ponto de estar parada, agora pelo caminho de árvores sem folhas e a rua interrompida que eu revia daquele jeito estranho de já ter estado lá sem nunca ter, hesitava mas ia indo, no meio da cidade como um invisível fio saindo da cabeça dele até a minha, quem me via assim molhada, não via nosso segredo, via apenas uma menina molhada sem capa nem guarda-chuva, maquiagem borrada, só uma garrafa de whisky barato apertada contra o peito. Era a mim que ele chamava, pelo meio da cidade, puxando o fio desde a minha cabeça até a dele, por dentro da chuva, era para mim que ele abriria sua porta, chegando muito perto agora, tão perto que uma quentura me subia para o rosto, como se tivesse bebido o whisky todo, trocaria minha roupa molhada por outra mais seca e tomaria lentamente minhas mãos entre as suas, acariciando-as devagar para aquecê-las, espantando o roxo da pele fria. Começava a escurecer, era cedo ainda, mas ia escurecendo cedo, mais cedo que de costume, e nem era inverno, ele arrumaria uma cama larga com muitos cobertores, e foi então que escorreguei e caí e tudo tão de repente, para proteger a garrafa apertei-a mais contra o peito e ela bateu numa pedra, e além da água da chuva e da lama dos carros a minha roupa agora também estava encharcada de whisky, como uma bêbada, fedendo, não beberíamos então, tentei sorrir, com cuidado, o lábio inferior quase imóvel, e pensei na lama que ele limparia terno, porque era a mim que ele chamava, porque era a mim que ele escolhia, porque era para mim e só para mim que ele abriria a sua porta, que ele desistiria da sua viagem.


Chovia sempre e eu custei para conseguir me levantar daquela poça de lama, chegava num ponto, eu voltava ao ponto, em que era necessário um esforço muito grande, era preciso um esforço muito grande, era preciso um esforço tão terrível que precisei sorrir mais sozinha e inventar mais um pouco, aquecendo meu segredo, e dei alguns passos, mas como se faz? Me perguntei, como se faz isso de colocar um pé após o outro, equilibrando a cabeça sobre os ombros, mantendo ereta a coluna vertebral, desaprendia, não era quase nada, eu mantida apenas por aquele fio invisível ligado à minha cabeça, agora tão próximo que se quisesse eu poderia imaginar alguma coisa como um zumbido eletrônico saindo da cabeça dele até chegar na minha, mas como se faz? Eu reaprendia e inventava sempre, sempre em direção a ele, para chegar inteira, os pedaços de mim todos misturados que ele disporia sem pressa, como quem brinca com um quebra-cabeça para formar que castelo, que bosque, que verme ou Deus, eu não sabia, mas ia indo pela chuva porque esse era meu único sentido, meu único destino: Chegar a aquele aeroporto, e procurando como quem perde um filho, talvez. Olhando por todos os lados, lamentando as despedidas, os aviões que decolavam. E olhava outra vez sem saber se iria o encontrar. Sem me importar se as pessoas achassem que perdi alguém muito importante, desesperada, com lagrimas nos olhos e borrada pela maquiagem, escova desfeita e roupas encharcadas. Eu olhei outra vez e outra vez, direita, esquerda. Foi quando eu o vi entrando naquele avião e partindo.. Água de chuva e lama e whisky batendo e continuava chovendo sem parar, mas eu não ia mais indo por dentro da chuva, pelo meio da cidade, eu só estava parada na frente daquele vidro fazia muito tempo, depois do ponto, tão escuro agora que eu não conseguiria nunca mais encontrar o caminho de volta, nem tentar outra coisa, outra ação, outro gesto além de continuar olhando, olhando, olhando, olhando, aquele avião partindo, decolando, que é impossível de parar, olhando, olhando e vendo ele partir...
"Mas não te procuro mais, nem corro atrás. Deixo-te livre para sentir minha falta, se é que faço falta… Tens meu número, na verdade, meu coração, então se sentir vontade de falar comigo ou me ver, me procura você."

"Fiquei. Você sabe que eu fiquei. E que ficaria até o fim, até o fundo. Que aceitei a queda, que aceitei a morte. Que nessa aceitação, caí. Que nessa queda, morri. Tenho me carregado tão perdido e pesado pelos dias afora. E ninguém vê que estou morto."

"Porque a vida segue. Mas o que foi bonito fica com toda a força. Mesmo que a gente tente apagar com outras coisas bonitas ou leves, certos momentos nem o tempo apaga. E a gente lembra. E já não dói mais. Mas dá saudade. Uma saudade que faz os olhos brilharem por alguns segundos e um sorriso escapar volta e meia, quando a cabeça insiste em trazer a tona, o que o coração vive tentando deixar pra trás."

É isso ai, né?

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Devaneios

As duras nos separamos.

E ficamos com aquele gosto amargo na boca

Aquela revolta, aquela tristeza, foi igual para os dois. Nem menos, nem mais

Aquele vazio intenso que é difícil explicar..

Pode ser que eu tenha ido a algum lugar, cambaleando, sentindo dificuldades em caminhar,

Mas você não.. Você se levantou. Mudou de cidade, e começou tudo de novo.

Incrível como pudeste ter sido tão forte para seguir com nossos planos, sozinho.

E como deve ter sido solitário não poder compartilhar com seu amor, nossos desejos..

E em cada lugar que passava, eu estava muito distante, olhava o céu, sentia aquele friozinho na barriga quando aquela brisa inexplicável dizia sussurros em meus ouvidos

Nossos sonhos..

Mas é claro que você iria encontrar alguém, mais dia, menos dia

Alguém que te acompanhasse, que te desse colo, que fizesse cafuné,

Que cruzasse o seu caminho e que fosse inesquecível

Alguém que dividisse com você os seus planos, que um dia foram nossos, e que seguiriam viagem

Eu te acompanho de longe, baixinho, quase que despercebida

Vejo todos os seus novos sorrisos e vejo os seus novos planos. Eu vejo suas fotos

Acompanho a sua sombra, querendo ver a minha ali também, ao seu lado, como de costume

Vem aquele nó seco na garganta ao ver um sorriso a seu lado que não é meu

E que nem vai mais ser, nem hoje, nem nunca

Uma historia que não se esquece, que não se supera e que não vai voltar..

Apesar de todo o sofrimento que me causa, ver você assim, tão feliz, com um outro alguém,

O doloroso torna-se satisfatório. É quando a generosidade supera o amor.

Apenas nesse momento, por pouco que possa durar, é quando de tanta tristeza, nasce ali daquelas cinzas, um sorriso frouxo, maior que tudo, dizendo-me que você esta bem agora.

É por isso que eu sei que te amo. Porque não te possuo, nunca te possui. Mas eu sempre fui sua e não quero ser de outro alguém. Porque esse lugar sempre foi seu, você o conquistou. E isso não tem fim, não esta maior, nem menor. Eu apenas te amo, sem futuro. Apenas assim..

"De tarde quero descansar, chegar até a praia e ver se o vento ainda está forte.
Vai ser bom subir nas pedras...
Eu sei que faço isso para esquecer, eu deixo a onda me acertar e o vento vai levando tudo embora..."

domingo, 1 de abril de 2012

Talvez as coisas não tenham saído bem como eu planejei, mas se eu tivesse uma chance de repetir e fazer tudo de um modo diferente, eu não o faria, porque a primeira coisa que se deve ter é a certeza do que se esta fazendo. Eu repetiria tudo, do mesmo jeitinho que foi, e depois, encontraria as mesmas desculpas para não me arrepender do que não deu certo.

hello witch

Como a terra Meu corpo é fértil  E em mim florece A vida e a abundancia  Como a água  Eu sou fluida E navego Pelo fluxo do todo Como o ar Eu...